segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

NÃO VER NEM HOMEM NEM MULHER, MAS JESUS

Trecho extraído do livro “GINETTA. UMA VIDA PELO IDEAL DA UNIDADE”.

Como Chiara era uma moça, começou a transmitir essa vida a moças. Porque ela não conhecia o plano de Deus, o que Deus queria, mesmo percebendo desde o início que era uma espiritualidade feita para todos, porque jorrava do Evangelho, e o Evangelho é feito para todos. Mas ali éramos somente nós, algumas moças; depois havia um padre, que era o diretor da Ordem Terceira de São Francisco, havia um irmão, religiosa da mesma família franciscana, havia frei Boaventura e, por fim, um jovem também da Ordem Terceira. Lembro-me de que Chiara, e somente ela, tinha contato com estas últimas três pessoas. Mas nós nunca tínhamos tido um contato com a parte masculina.
Quando Chiara foi para Roma, em 1949, comecei a transmitir a Palavra de Vida àquelas pessoas que tinham contato conosco e a visitá-las.
Fui à casa do nosso primeiro focolarino, Marco Tecila, eletricista, que conheceu Chiara e as suas primeiras companheiras nos tempos de guerra.
Aliás, foi assim que ele conheceu o Ideal: nós tínhamos um fogãozinho elétrico para fazer a comida. Acontecia que Chiara nos chamava de vez em quando para nos falar de Deus; e nós permanecíamos ali encantadas a ouvir e nos esquecíamos de que tínhamos deixado o leite no fogo! O leite derramava e queimava a resistência. Assim, precisávamos de um eletricista. E veio Marco. Ele ficava sempre trabalhando, mas às vezes escutava alguma coisa.
Então, comecei indo visitar a mãe dele. Lia a Palavra de Vida com ela. Fiz a mesma coisa com uma vizinha da casa onde eu morava. E começamos, um a um. Toda semana íamos transmitir as experiências da Palavra de Vida, porque naquela época toda semana tínhamos uma frase nova.
Portanto, era sempre alguém da parte feminina. Acontecia que essa pessoa ficava impressionada, talvez falasse ao marido e, depois de uma segunda, terceira vez, também o marido estava conosco. Mais tarde, em outra circunstância, ia o filho; em outra circunstância, o colega; em outra circunstância, um parente de passagem... Assim, eu começava a ver que, no meio da parte feminina, aos poucos, havia sempre também algum homem.
Entre eles, estava também o pai de Chiara.
Eu conseguia fazer encontros para uns trinta grupos.
E como é que se fazia para realizar esses encontros? Eu aproveitava o intervalo que as pessoas tinham no trabalho entre o expediente da manhã e o da tarde. E de um intervalo a outro – eu tinha uma bicicleta – passava de um encontro para outro, de um encontro para outro.
Não havia ônibus naquela época, nem tínhamos telefone. O encontro era mais ou menos de quarenta e cinco minutos. O tempo necessário para se despedir, sair de bicicleta e, depois, chegar até o expediente da tarde.
Além desses encontros pessoais, realizava um encontro plenário todo mês. Todas essas pessoas que procurava encontrar para viver em unidade a Palavra de vida eu as convidava para o plenário.
(...)
Um dia, eu vi que havia três homens. E para nós era uma novidade. Nos pequenos encontros havia homens, como eu disse: o marido, o tio, o avô, o irmão, o vizinho... porque todos ficavam interessados, todos, todos; a parte masculina dava uma resposta espetacular – lembro-me bem.
Mas ali se tratava de um encontro maior! Chiara nos acostumou a não ver nem homem nem mulher, mas a ver Jesus em todos. Portanto, homens ou mulheres, para nós, eram a mesma coisa; tratava-se de fazer a vontade de Deus naquela situação que representava uma novidade.
Pensei comigo mesma: Depois, direi a eles, com toda a caridade, que nos pequenos encontros fico feliz em me encontrar também com eles, mas talvez neste encontro aqui, da parte feminina, é melhor que não venham. Formulei esse propósito.
“O homem propõe e Deus dispõe”. Não foi necessário que eu fosse até eles; foram eles que vieram até mim primeiro. E me disseram:
– Olhe, por que somente as mulheres querem se santificar? Também nós queremos nos santificar.
Eu disse:
– Vocês esperem dois dias, que vou dar uma resposta.
Perguntei-me: Quem é que me diz a vontade de Deus na ausência de Chiara? É o bispo. Contei-lhe essa experiência, e ele me deu a sua benção.
Lembro-me de que passou para a história o número: cinqüenta homens, de todas as idades e classes sociais.
(...) Tudo nasceu tão espontâneo!... Mas era a hora de Deus.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O ENCONTRO COM O CRUCIFIXO VIVO

Trecho extraído do livro ‘GINETTA. UMA VIDA PELO IDEAL DA UNIDADE’.

No Brasil reconheci o Crucifixo vivo na pobreza do focolare; mas me parece tê-lo encontrado, de forma chocante, no povo que eu via pelas ruas, nos pobres.
Antes, não conhecia a pobreza, a fome; não sabia o que era isso: ver uma pessoa faminta, ver uma pessoa explorada, oprimida, ridicularizada, caluniada, esmagada. E, no entanto, são homens, são criaturas como nós! Digo muitas vezes que, pela sensibilidade que tenho, se não morri, foi uma graça de Deus; porque eu não conhecia este aspecto. Se você acompanha as revistas, os jornais ou lê algum livro, eles não dizem nada! Eu acreditava que ao menos os velhinhos estivessem alojados num asilo, ou os doentes em algum hospital, mesmo ruim, talvez abandonados, sem cuidados, mas que tivessem ao menos uma cama... Mas ver as pessoas dormindo nas calçadas, para mim, foi uma coisa fortíssima, fortíssima!
E ali foi se revelando um aspecto de Jesus Abandonado que eu não conhecia – conhecia mais a parte espiritual Dele, aquele abandono de Deus, aquela ausência de deus, mais tarde nas dores morais, talvez nas dores físicas, mas não muito; nas dores físicas entendi aqui no Brasil! A cada passo deparava com Ele. Encontrava-o nas ruas, nas praças, na praia – não é que ia muito à praia, mas quando, por acaso, andava pelas ruas do bairro de Boa Viagem, o encontrava!
Quando chegamos, não tínhamos nada... E teríamos vontade de bater de porta em porta, para pedir esmolas e dizer: Ajudem-me, dêem-me alguma coisa para matar a fome destes e daqueles.
E ali Deus quis um passo meu, porque vi os nossos limites, vi que não conseguíamos... Ali havia fome, havia desnutrição, havia desprezo, pessoas humilhadas, esmagadas, como se houvesse tanques de guerra passando por cima da pobreza... com uma indiferença, sem saber o que faziam. Tanques que passam por cima, sem parar, sem olhar, sem piedade, com o coração de pedra! Aquilo que na Europa eu não conhecia... é uma experiência que fiz somente aqui! Foi algo duríssimo, porque deparei com os meus limites, os nossos limites.
Precisávamos da comunhão dos bens para irmos para frente... E foi ali que entendi: Somente Deus pode fazer alguma coisa. Deus é Pai! Um Deus que nós temos de apresentar. Trata-se de um coletivo, um Deus que é um coletivo, ou seja, as comunidades.
Tínhamos, diante de nós, um povo sem Deus. Aquele que é esmagado está sem Deus, pois quem é que lhe fala de Deus?! Aquele que está por cima talvez tenha conhecido Deus, mas... não se interessa. E aquela situação era como um grito, como se se apresentassem somente estas palavras: Deus, Deus, Deus, Deus! E esse grito precisaria ser multiplicado. Ali, entendi o pai-nosso, sobretudo a segunda parte: “O pão nosso de cada dia nos daí hoje”.
Mas assistia a tantos milagres, a tantos milagres na cidade de Recife, mas tantos mesmo! Seria preciso escrever livros e mais livros para dar glória a Deus, para dizer que o Evangelho é verdadeiro, que, se tomamos as palavras de Deus ao pé da letra, Ele responde. É uma coisa incrível!